sábado, 7 de novembro de 2015

Para Vovó Lourdes

Hoje é um dia de dor. É aquele dia que a vida lembra a gente que ela é finita. Que a passagem na terra chega ao fim.

Sei que existia uma abismo geracional, intelectual imenso entre nós. Sou filha da sua filha, sua neta. A primeira mulher da minha geração. Não sei se isso fazia diferença pra senhora que achava todos os netos lindos.

Não conseguirei escrever esse texto...


Talvez eu nunca consiga expressar em palavras o que minha avó Lourdes significa pra mim. Acho que esse afeto não é verbalizável. Espero que tenha conseguido demonstrar enquanto ela esteve por aqui.

Foto: Cláudia Kiya
Ela fazendo suas colchas de retalhos...

terça-feira, 3 de novembro de 2015

Carta aos amigos baianos!

Brasília, Novembro de 2015.

Quando a gente vai viver fora da Bahia e tem que se adaptar a outro clima tão diverso, que não conhece o termo ameno, sempre frio ou quente demais, e sem umidade em grande parte do ano, você fica sonhando com o calor litorâneo, com a vida daquela cidade...
Ainda bem, que mesmo aqui, existem os reencontros através da Cultura. É bom ser agraciada, vez ou outra, com uma atração da Bahia, elas sempre colorem o coração. E se falarem diretamente com as tradições, que estão tão fortes e latentes nas ladeiras da Cidade de Salvador, aí é que o coração se enche de mais felicidade. Num misto de emoções que fazem ir do riso ao choro num décimo de segundos.

*Fotos: Anne Vilela
Foi assim que me senti ao ir pro show do Ilê Aiyê na última sexta-feira, nas Praças dos Orixás, na beira do lago Paranoá. O show fez parte do Festival Abre Caminhos. Quantos símbolos! Festival em comemoração à herança dos sons de terreiro presentes no samba. Nada de fastfoods. Comida vendida era comida de terreiro: acarajé, abará, caruru, entre outras... Sem falar nesse recado mais que certeiro para o Congresso Nacional de respeito e tolerância ao povo de santo.


No mais, por aqui começou a chover. O calor deixou de ser insuportável, voltamos a ter friozinho. Melhor assim... Fico por aqui. São poucas as notícias do Cerrado Central.

terça-feira, 16 de junho de 2015

Reflexões sobre o Feminicídio

 Jorram vozes no meu ouvido. Vozes de mulheres. Adultas, adolescentes, crianças. Vozes que querem falar de um modo de vida, da sua história, das suas lembranças, das suas relações, da família, da/o companheira/o. Do singular e do plural.
Há outras vozes, que nos permitem novas reflexões.
Elas chegaram sem nem mesmo saber que estavam chegando. Elas chegaram e nem mesmo chegaram fisicamente. Foram transformadas. Em estatística, em siglas... Fazem o uso da mediação de corpos militantes.

Falar
Sinto que as mulheres estão sempre sensíveis e dispostas a falar, discutir e compartilhar questões de gênero. Principalmente, se há violência envolvida. Sempre tem a história de uma amiga, da mãe, da avó, da vizinha, do viral na internet, ou a sua própria história (sendo relatada ou não na primeira pessoa). Há uma crença na nossa sociedade de que a dita igualdade que a Constituição Federal fala em seu artigo 5º, é real no cotidiano de mulheres e de outras minorias. Para quem tem dúvida sugiro fazer uma escuta “atenta e humanizada” dos casos. Ou simplesmente se perguntar? Por que as mulheres (aqui também pode se inserir qualquer grupo minoritário) tem tanta necessidade de falar sobre a sua constituição histórica? Ou por que tantas mulheres precisam contar a sua história de violência?!
Na época da promulgação da lei do Feminicídio no início de 2015, acompanhei muito de longe os comentários e as discussões. Primeiro, porque de tempos em tempos tenho necessidade de Detox das discussões militantes; fico sensível a tudo e acabo ficando muito deprimida e desesperançada com alguns movimentos conservadores. Segundo, porque era uma alteração no Código Penal, tipificando o assassinato de mulheres como crime hediondo. Achei positivo mas por outro lado ficava pensando que era mais uma vez uma lei. As leis teriam a força de mudar o machismo enraizada na nossa sociedade? E a lei Maria da Penha, que tenta combater em vários aspectos a nossa cultura de violência gênero? Não tem funcionado?

Despertar
Há duas semanas participei de um Seminário sobre tema, cujo título era: Determinação social e o enfrentamento da violência contra as mulheres no contexto da Lei do Feminicídio. Estava resistente.
Nesses dias vivi uma imersão na discussão. Uma boa imersão, que floresceu novos questionamentos a partir das discussões feitas.

Parênteses: este texto é uma tentativa de elaborar as discussões que tive a partir das minhas leituras anteriores. É um exercício, antes de tudo, que tento fazer com alguma frequência. Talvez eu consiga, talvez só chegue até metade do caminho. Tenho muita dificuldade em elaborar textos em cima das falas de outros. Fecha parênteses.

Gosto das contextualizações históricas. Sempre que se fala, se fala a partir de um tempo e de um lugar. Por mais que se tente universalizar as histórias, como Betty Milan1 costuma fazer, para criar uma empatia entre quem produz e quem lê. Isso para dizer: não se fala em opressão de gênero hoje, apenas pelo hoje. Se fala, principalmente, pelo caminho que foi percorrido até aqui. Com muitas vitórias, de certo, mas com muitas batalhas ainda para ganhar.

Feminicídio
Falar em feminicídio, é falar em uma epidemia, em algumas regiões do país. É falar de uma cultura de violência. É falar de uma sociedade patriarcal onde a mulher ainda é encarada como objeto. Falar de um sistema de regulação de corpos. É falar da sexualidade vigiada das mulheres. É falar de reserva de espaços público e privado a partir da representação de gênero.
Para começar uma conversa sobre o feminicídio temos que ter em mente que o reconhecimento da lutas das mulheres não começa com promulgação da lei. Pelo contrário, o movimento sofre uma derrota com a promulgação. Na redação da lei saiu a palavra gênero e ficou “sexo feminino” (“contra a mulher por razões da condição de sexo feminino”). E as pessoas trans?
Sendo que:
Considera-se que há razões de condição de sexo feminino quando o crime envolve:
I - violência doméstica e familiar;
II - menosprezo ou discriminação à condição de mulher.”
Quando um prostituta é morta, ela entra nas estatísticas de feminicídio? É uma mulher, sendo morta por discriminação à sua condição. Mas, como é tratada pelos órgãos oficiais?!
Não acho que a questão da violência de gênero se resolva com a assinatura de uma lei. E tenho minhas dúvidas que funcione como um processo educativo.
A lei do Feminicídio trata da morte de mulheres. Não queremos que mulheres sejam mortas por suas/seus companheiras/companheiros. Queremos que as mulheres sejam respeitadas e tenha liberdade de fazer as suas escolhas, e que o estado garanta as oportunidades.
Quando, em 2006, foi a promulgada a Lei Maria da Penha achei que era um avanço no reconhecimento da desigualdade de gênero, um reconhecimento institucional do que mulheres vivem cotidianamente. Não só a violência física mas as muitas nuances de violências.
É importante termos em mente que a nossa sociedade é uma sociedade violenta, não só pelo números de mortes violentas e da violência urbana. Somos violento no nosso dia a dia, na palmada no filho, na grosseria com o colega de trabalho, no trânsito a cada ultrapassagem. Nas nossas músicas infantis; basta lembrar de “atirei o pau no gato”.
Muitas vezes reproduzimos comportamento violento sem nos darmos conta. É sempre  bom lembrar.

Encerrando a conversa
Eu sei que abri muitas questões. Porém meu esforço há muito foi excedido.
Têm muitas discussões a serem feitas. No âmbito do Direito, da Sociologia, da Saúde. Há muitas pesquisas sendo realizadas dentro e fora das Universidades.
O que quero ter em mente é do exercício diário de uma militância. Da importância das leituras, das atualizações. Da escrita crítica. Do processo de racionalização do conhecimento. Da tentativa solitária de fazer pensar, de sociologizar a vida.

Seguem algumas referências:
Acessado em: 09/06/2015


1Psicanalista brasileira escreveu: “Aprendi com o trabalho que, seja qual for a história, nós podemos nos reconhecer nela, porque a escuta humaniza. Quando escutado, o drama do outro pode se tornar meu. Tiro dele ensinamentos preciosos.” p. 12

quarta-feira, 22 de abril de 2015

Andanças Soteropolitanas


Eu adoro andar, andar nas ruas sem muito compromisso para onde vou. Quantas vezes sai de casa um pouco angustiada e andei sem destino. Logo quando comecei a trabalhar na livraria saia no dia da minha folga para o centro da cidade para andar sem compromisso, gosto de andar no centro. Gosto da gente que frequenta o centro.

Tinha um primo que me mostrou o quanto andar nesta cidade era maravilhoso. Que me fez conhecer os botecos mais simples da Carlos Gomes, numa busca por sopa barata e gostosa. Não tinha medo, ou o medo era amenizado pela companhia dele e pela gratificação de descobrir novos lugares e novos sabores. Não há nada que me tire da lembrança a sopa tomada num balcão do bar antigo. Ou do bar chinês (ou coreano ou qualquer um de origem oriental). Ficaram alguns lugares sem conhecer, ficou a promessa que iriamos um dia... Ele se foi, será que terei aquela coragem de ir, sem ele?!

Hoje ando menos pelas ruas desta cidade. E vejo cada vez menos pessoas andando nas ruas. Quando vim morar em Salvador, fui morar num conjunto habitacional. As pessoas ficavam na frente dos prédios até tarde da noite, jovens, velhos, crianças. Só não ficavam quando chovia. No começo, com o passar dos anos, via cada vez menos pessoas nas ruas. Eu mesma ficava conversando com os amigos da rua(quando eles começaram a existir), com paqueras. Começaram a assaltar na frente dos prédios. No ponto de ônibus em frente ao meu prédio. A rua foi ficando cada vez mais vazia. Deixei de frequentar a frente do prédio. Fomos ficando mais em casa.

Gostava de ir para a faculdade andando. Saia da Federação e ia para o Comercio, andando. Saia da Federação e ia para a Vila Laura, andando. Saia da Federação e ia para o Porto da Barra ver o por do sol e tomar banho de mar a noite, andando.

E quantas vezes conhecia melhor o paquera da vez pelas ruas, seja da faculdade até o ponto para irmos para o trabalho. Ou em qualquer outro lugar: pelo centro da cidade, pela Barra, pela Graça, pela Vitória, Ondina, Pituba, Rio Vermelho...

O Centro Histórico; era o lugar que mais frequentava, ia para todos os shows, ou simplesmente ia ficar de bobeira, com minha amiga e encontrar uns amigos sem nada demais para fazer. Gostava, até o dia que meu namorado e eu fomos assaltados. Passei um bom tempo sem frequentar, voltei recentemente com uma amiga que gosta de andar também...


Andar pelas madrugadas na cidade... Viver essa liberdade que só a noite nos permite ter. Na última sexta-feira sai de um aniversário de uma amiga e fui andando, com mais quatro amigos, até um outro bar. O corpo pulsava pela liberdade da caminhada nas noites soteropolitanas.